O Brasil é o sétimo produtor de cacau do mundo. Mas seu principal papel é como intermediário. Quase todos os grãos de cacau que chegam ao Brasil vêm de Gana ou Costa do Marfim. Aqui, são processados, viram manteiga, gordura e óleo ou derivados, e depois exportados. Terminam a viagem nas prateleiras da Europa, aquelas delícias que gostamos tanto. Qual o problema? As famílias, pequenas produtoras de cacau nestes dois países africanos, muitas vezes usam os filhos para colher e beneficiar os grãos. Na região, estima-se que mais de 1 milhão e meio de crianças estejam no trabalho infantil, segundo estudos do Cocoa Initiave (https://www.cocoainitiative.org). Um gosto amargo para empresas, investidores e consumidores, onde os riscos da cadeia de valor estão cada vez mais presentes, mas, nem sempre, são conhecidos ou bem endereçados.
Nós da arara.io sabemos que essa é uma questão complexa, atinge várias outras indústrias e países. Mas acreditamos no esforço coordenado dos players da cadeia de abastecimento. Os agentes reguladores já entenderam que esse é um problema coletivo, e começam a dar visibilidade – e responsabilizar- às ações e omissões das partes envolvidas, seja direta ou indiretamente. No Brasil, B3, Anbima, CVM, Banco Central , entre outros, criam novas regras. Saiba o que é essencial para você nesse quadro novo regulatório que se inicia.
O Banco Central passou a exigir que instituições financeiras contabilizem potenciais perdas provenientes de fenômenos relacionados a mudanças climáticas. Para isso, os bancos devem estabelecer a Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC) e implementar ações para garantir sua efetividade, o que será obrigatório a partir de 1º de dezembro de 2022. E o que muda com a nova regra? (saiba mais)
A PRSAC prevê que a instituição indique um comitê com diretor responsável pelo cumprimento da resolução. Bancos passam a ter que capturar informações relacionadas a ESG com seus clientes para integrá-las na gestão de riscos (e isso deve estar alinhado com a política de responsabilidade socioambiental e climática da instituição);
As instituições financeiras também devem divulgar os níveis de riscos que estão dispostas a assumir, incluindo os riscos social, ambiental e climático.
Assim, fica claro que os bancos terão o papel de ajudar na agenda ESG no Brasil – pois podem avaliar os impactos ambientais causados por uma empresa para definir a taxa de juros ao conceder um crédito – e o real impacto que isso traz para a economia, negócios e investimentos. A ação dos reguladores gera um efeito cascata na relação com outros stakeholders, pois impacta a tomada de crédito, negociações com bancos e empresas listadas, e tem ainda mais repercussão quando a companhia é listada em bolsa.
A B3 está olhando bastante para o “S” do ESG, talvez a letra mais preocupante no espectro brasileiro, com regras de diversidade das empresas listadas. A proposta da B3 ficou em audiência pública até setembro e entra em vigor a partir de 2023, de modo faseado, após passar pelo aval da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A B3 quer que as companhias tenham políticas de remuneração variável atreladas ao tema.
Até 2026, as companhias terão de ter pelo menos uma mulher e um membro da “comunidade minorizada” — o que inclui pessoas negras, que se identifiquem como LGBTQIA+ ou pessoa com deficiência — no conselho de administração ou na diretoria em estatuto. Quem não cumprir a regra, terá que se justificar e fazer um movimento para se adequar. Hoje, das 423 empresas listadas, 61% não possuem nenhuma mulher na diretoria estatutária e 37% não possuem nenhuma mulher no conselho de administração. No recorte racial, a maior parte das empresas sequer reporta os dados.
A mudança da B3 segue a linha regulatória da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que exige que as empresas divulguem informações ESG no formulário de referência, a partir do ano que vem.
Anbima estabeleceu novas referências para definir fundos de investimento sustentável, semelhante à nova classificação da autoridade europeia, o Regulamento de Divulgação de Informações Financeiras Sustentáveis da EU. Aqueles que têm a sustentabilidade como propósito poderão usar o sufixo IS (Investimento Sustentável) no nome. Os fundos que integram questões ESG, mas não têm a sustentabilidade como objetivo, não terão essa distinção. No entanto, eles poderão incluir uma frase que informe essa condição em seus materiais de venda. Os fundos que não comprovarem serem sustentáveis deverão excluir qualquer termo que remeta a isso, como ESG, ASG, verde, impacto, entre outros.